ORCHIDACEAE
A família Orchidaceae
é uma das maiores famílias de plantas floríferas do mundo e é considerada por
alguns autores como uma das mais evoluídas. Esta família engloba cerca de 750 a
850 gêneros e de 25.000 a 30.000 (HOSSAIN, 2011; GIVNISH et al, 2015) espécies
distribuídas em todos os continentes, sendo a maior quantidade de espécies
encontradas nos trópicos.
As orquídeas apresentam
boa reputação como fitoterápico, principalmente na China, onde várias espécies
estão incluídas na Matéria Médica (Shen Nung Pen-tsao Ching) Chinesa e são
utilizadas como fonte de remédios fitoterápicos na China desde 2800 A.C. (HOSSAIN,
2011; BULPITT et al, 2007). Como exemplo, tubérculos de Bletilla striata são usados para tratar tuberculose, úlceras,
hemorragias e feridas. Outros usos na China, na Mongólia e no Japão focam no
tratamento de ansiedade, distúrbios respiratórios, distúrbios da pele, câncer
de mama, distúrbios gastrointestinais, febre, antraz, malária e micose.
Orquídeas do gênero Epidendrum são
usadas nos trópicos americanos para tratar feridas nos lábios. Na África do
Sul, várias orquídeas são usadas para o manejo de doenças infecciosas e
infertilidade. Na Índia, várias espécies são principalmente exploradas como
agentes de cura de feridas. No Himalaia, algumas espécies de orquídeas são usadas
para tratar distúrbios renais e urinários (SUT, et al, 2017.; BULPITT, 2005).
A referência mais antiga
às orquídeas neste continente é registrada no "Manuscrito de
Badianus", de 1552. O primeiro livro americano sobre plantas medicinais,
"Badiano Codex", de Martin de La Cruz - Médico Asteca, referiu-se a Vanilla planifolia como uma erva útil
para o tratamento da histeria, febre, impotência, reumatismo e para aumentar a
energia dos sistemas musculares. Outras orquídeas descritas neste tratado são: Encyclia citrina, usada por nativos em
feridas infectadas; Laelia autumnalis
para tosse; Stanhopea hernandezii
para insolação; Arpophyllum spicatum,
Bletia catenulata, Cranichis speciosa e Epidendrum pastoris para tratamento
da disenteria (HOSSAIN, 2011; BULPITT, 2005).
Os compostos químicos
isolados a partir de orquídeas geralmente são classificados como
alcaloides, flavonoides, fenantrenos, estilbenos, carotenóides, antocianinas,
triterpenos e esteróis. Entre eles, os alcaloides e os flavonoides são os mais
importantes devido suas propriedades biológicas. Estudos de alcaloides de
orquídeas datam de 1892, quando E. de Wildeman iniciou a investigação de
alcaloides a partir de algumas espécies de orquídeas europeias. No final da
década de 1890, W. Boorsma estudou os alcaloides das orquídeas no Jardim
Botânico de Bogor e detectou a possível presença desta classe de substâncias em
Paphiopedilum javanicum e Liparis parviflora, entre outras
espécies (HOSSAIN, 2011).
Apesar da grande
variedade de formas biológicas e dos relatos na literatura, a família
Orchidaceae até agora foi pouco explorada por seus constituintes químicos (SUT et
al, 2017), se considerarmos as milhares de espécies naturais existentes e as
centenas de milhares de híbridos comerciais disponíveis. Nosso grupo de
pesquisas tem contribuído nos últimos anos para o estudo químico e
farmacológico de orquídeas nativas do Brasil. Entre os estudos de orquídeas
endêmicas da mata Atlântica, podemos citar o trabalho realizado com a espécie Maxillaria picta (Figura 1), que
apresentou atividade citostática contra diversas linhagens de células
cancerosas humanas e uma efetiva atividade sobre a viabilidade das diferentes
formas dos parasitos Trypanosoma cruzi e Leishmania amazonensis. O isolamento e
identificação de compostos esteroidais, triterpenos, estilbenos (Figura 2),
dentre outros foi realizado por Almeida et al, 2014. Estudos com a orquídea
amazônica Oncidium baueri (Figura 1) também foram realizados, novamente isolando-se compostos
característicos da família e com atividade biológica similar ao estudo anterior
(MONTEIRO et al, 2014), incluídas flavanonas inéditas (Figura 2). O estudo
químico da orquídea Miltonia flavescens
(Figura 1) permitiu o isolamento e caracterização do flavonoide hortensina (Figura 2), que se mostrou especialmente ativo contra células de carcinoma de ovário
humano (PORTE et al, 2012).
Maxillaria picta
Oncidium baueri
Miltonia flavescens
Figura 1 - Maxillaria picta, Oncidium baueri e
Miltonia flavescens. (Fontes: ORQUIDÁRIO RECANTO DAS FLORES, 2018; ORQUIDÁRIO ANIELA, 2018; ORQUÍDEAS
ENCANTO E PAIXÃO, 2018).
Figura 2 - Substâncias isoladas de Maxillaria picta (foiumbenos B e C),
Oncidium baueri (oncibauerinas A e B) e Miltonia flavescens (hortensina).
No estudo fitoquímico
realizado por Belloto et al, 2017, da espécie Laelia marginata (Orchidaceae) (Figura 4), foi possível o
isolamento de um novo produto natural denominado ácido crispoico (Figura 3),
além de compostos pertencentes a classe dos fenantrenos, triterpenos,
estilbenos flavonas e compostos fenólicos. Ensaios biológicos com extrato bruto
da planta, frações e compostos isolados foram realizados contra duas linhagens
humanas de câncer (Hela e Siha), e os parasitas tropicais Trypanosoma cruzi e Leishmania
amazonensis. O fenantrenoide 9,10-di-hidro-4-metoxifenantreno-2,7-diol foi
ativo contra células Hela e Siha (CC50 5,86 ± 0,19 e 20,78 ± 2,72 μg
mL-1, respectivamente).
O estudo fitoquímico de Gomesa recurva (Figura 4) realizado por
Savaris et al, 2018, permitiu a identificação de nove compostos, sendo da
classe dos esteroides, dos fenantrenos (3,4,9-trimetoxi-2,5-fenantrenodiol (1);
4-metoxi-2,3,5-fenantrenotriol (2); 3,4-dimetoxi-2,5-fenantrenodiol (3),
2,4-dimetoxi-3,5-fenantrenodiol (4)) (Figura 3) e compostos fenólicos. Ensaios
biológicos contra fungos, parasitas neotropicais e linhagens celulares de
câncer humano também foram realizados.
Figura 3 - Substâncias isoladas de Laelia marginata (ácido crispoico) e Gomesa
recurva (fenantrenos).
Gomesa recurva
Laelia marginata
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